quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

SOFT SKILLS - Um Roteiro de Atitudes





Pondo os Pés na Terra
Quando se fala em recursos humanos, seja sobre empregabilidade, talentos, erosão, carreiras, ou outro qualquer subtema, quase sempre alguns dos intervenientes traz a questão Soft Skills à colação. Ainda bem, dir-se-á, pois trata-se de assunto demasiadamente importante para ser ignorado.
Não é a primeira ocasião em que este tema é tratado em artigos deste blogue (ver SOFT SKILLS – Definindo Limites). Uma vez que os contornos de âmbito do debate se encontram definidos, proponho-me desta feita avançar para um estilo de exposição mais operacional – Será possível construir uma lista de comportamentos a seguir e a evitar nas relações das pessoas com os outros, sejam indivíduos ou organizações?
 
Conversa “pesada” (Hard) à volta de assuntos “delicados” (Soft)

A própria tradução dos auto-explicáveis termos ingleses introduz entropia – o uso de sinónimos como “pesado” ou “duro” em oposição a “leve”, ou “delicado” permite interpretações, necessariamente subjectivas, consideradas como pouco próprias ao léxico empresarial, tradicionalmente objectivo, directo, e sério. Masculinizado até, porque não admiti-lo?
Desafio o leitor a recordar situações em que, ao introduzirem-se no debate sobre pessoas (a que chamaremos Recursos Humanos, embora não seja a minha designação preferida), questões como competências relacionais, estas foram relegadas para segundo plano, classificadas como insignificantes ou pouco relevantes, face às tradicionais competências técnicas. Arrisco terem sido mais do que porventura terá reparado na altura, em plena discussão de objectivos, promoções, ou impactes salariais, por exemplo.
Pois bem, proponho que dediquemos algum tempo a reflectir sobre isto. Serenamente. Sem a pressão da necessidade de tomar decisões urgentes.
Na verdade, os tempos de paz são os mais indicados para limpar e preparar as armas, dizem.
 
Carreira – Sucessão de Competências Técnicas (Hard Skills)

Carreira é uma sequência de conteúdos funcionais. Já não é a primeira que recorro a esta tecnocrática definição, tão do agrado dos técnicos de gestão de Recursos Humanos, mas que serve para o efeito. Trata-se de conjunto definido de patamares de exigências crescentes, desde o ponto de entrada até ao topo.
Pensemos na carreira X. Os indivíduos quando inseridos nesta carreira conhecem, em princípio, o que define os diferentes degraus desta escada. O primeiro degrau é, por exemplo e para não nos cingirmos a um caso concreto, SE-Trainee, SE-Associate, SE, Senior-SE, Advisory-SE, Consultant-SE1 . Para cada etapa estavam claramente definidas as competências técnicas requeridas (Hard Skills). Os profissionais, conhecedores destas definições, podiam lutar por promoções ou pela desistência, tentando-se por outras alternativas. Jogo limpo, portanto, em que as regras eram do conhecimento de todos.
Esgotar-se-iam neste frio e extremamente racional cardápio a abordagem, que pretendíamos eficaz, das questões que queriamos endereçar? A resposta é claramente não. Faltava aqui a componente emocional, a que diferencia os seres humanos para lá dos conhecimentos técnicos que cada profissional detém.
 
Carreira – Sucessão de Componentes Relacionais (Soft Skills)

Recorrendo a imagem bem brejeira – Tal como nos aparelhos de alta-fidelidade, não basta proceder à sintonização (hard tunning). A sintonização ideal, a que faz a diferença e nos delicia os ouvidos, faz-se controlando à sintonização fina (soft tunning).
Aos profissionais de sucesso, satisfeitos e motivados, não chega adquirir conhecimentos técnicos, é preciso ter arte para os colocar, de forma adequada, no terreno. Se se preferir, utilizando outra metáfora – o mais importante não é sabermo-nos vender, o ideal é que os outros nos desejem comprar. No fundo, uma distância semelhante à que separa as vendas (orientadas para a colocação dos produtos), do marketing (a satisfação das necessidades dos clientes).
Quantas pessoas é que o leitor conhece que se lamentam das oportunidades que perderam? Essas pessoas poderiam até ter conhecimentos que lhes augurariam grandes êxitos pessoais e profissionais, mas não souberam identificar as oportunidades na altura própria – geriram mal a conjuntura. É provável que o leitor também encontre episódios pessoais em que tal lhe tenha acontecido. Deixo consigo essa reflexão.
De que competências estou a falar? De habilidade nas comunicações, nas relações sociais, no comportamento grupal, no pensamento lateral2 , na interpretação das envolventes, ou nas capacidades de auto-gestão, por exemplo.


Escuta Activa

Há uns trinta anos atrás, lembro-me de ter de explicar aos meus clientes, como funcionavam as comunicações à distância, para que eles optassem pelas soluções informáticas que necessitavam, na minha perspectiva de parceiro e consultor. Falava-lhes em comunicações simplex (num só sentido), half-duplex (em ambos os sentidos, mas um de cada vez), e full-duplex (nos dois sentidos em simultâneo). Outros tempos, em que para comunicar dados à distância, não raro exigia a instalação duma linha telefónica privada, essencial para suportar transmissões a 2400 bps3.
 
A comunicação humana é full-duplex – ouvimos e falamos ao mesmo tempo. As capacidades humanas nesta área são imensas. Recordo que os especialistas afirmam que, em termos de comunicação, investimos cerca de 9% do nosso tempo a escrever, 16% a ler, 35% a falar, e 40% a ouvir. E acrescento eu, para relevar os perigos que quero abordar – passamos a vida a aprender a falar, a ler, e a escrever. E eu não conheço nenhuma escola onde se aprenda a ouvir. Contudo, escutar situa-se num patamar superior ao da elementar audição. Escutar é ouvir, interpretando, retendo e percebendo os nossos referenciais e daqueles que connosco intercomunicam. Por ora, é neste ponto que me quero fixar.


Comunicação Efectiva – Facilitadores

Os bons comunicadores sabem escutar os seus interlocutores, porque:

• Guardam silêncio até que os outros terminem o que têm para dizer;
• Parafraseiam, para se assegurarem que entenderam bem, antes de exporem a resposta ou os seus pontos de vista;
• Evidenciam apreço pelas razões alheias, mesmo que delas discordem;
• Mostram curiosidade e não apreensão pelas ideias alheias;
• Solicitam esclarecimentos adicionais, quando não entendem claramente os objectivos dos outros;
• Utilizam linguagem não-verbal na busca de empatia;
• Mostram-se abertos a opiniões divergentes;
• Focalizam-se no que os outros referem como importante;
• Questionam;
• Deixam que as emoções se manifestem, porque as conhecem bem.

Mas não praticam nenhum destes erros:

• Não permitem que o impulso comande a relação;
• Não litigam, confrontam;
• Não teorizam hipóteses;
• Não cedem à análise por estereótipos;
• Não tomam as primeiras impressões como definitivas;
• Não abusam do tempo que lhes é concedido;
• Não interrogam, perguntam;
• Não vagueiam, focalizam-se;
• Não aceitam conversas paralelas;
• Não pregam, expõem.

Além disso:

• São persistentes, não são obsessivos;
• São resilientes, não se deixam abater;
• São cooperantes, não são individualistas;
• São convencidos, sem serem arrogantes;
• Comentam, sem destruir argumentos.

Este conjunto de habilidades não se ensina nas escolas, pelo menos não consta dos programas oficiais, mas aprende-se na vida. Não será dum dia para o outro, é certo. Não é fácil, concordo. Mas o esforço paga-se a si mesmo com juros, quer se trate dum médico, engenheiro, gestor, artista, ou outro qualquer profissional.
 
Não valorize demasiadamente a sua profissão. Pense que duma forma ou doutra você é um prestador de serviços. Os outros também o são. E muito provavelmente também perseguem a excelência, como você. Em regime cordial ambos podem beneficiar.
A isto pode chamar-se Inteligência Emocional, Inteligência Relacional, ou Inteligência Social (ver Inteligência Emocional em Inteligência Emocional – Domínios e Etapas).

A designação não é o importante. A atitude é que conta.


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NOTAS:

1.       Recorro ao exemplo concreto dos levels com que me confrontei quando iniciei a minha carreira como Systems Engineer na IBM Corporation.
2.       Refiro-me ao feliz conceito de Pensamento Lateral, desinibido, descomprometido, alternativo, e complementar ao Pensamento Vertical, ainda que dentro da lógica cartesiana (ver, a propósito: Bono, Edward de (2005): O Pensamento Lateral, Cascais – Editora Pergaminho, Lda.)
3.       Imagine o leitor do que lhe estou a falar- 2400 bps. Porventura, hoje terá em sua casa uma ligação à internet superior a vários mega bits por segundo. A “pré-história” foi a poucas dezenas de anos…
 


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